O filho caçula de Adilson Maguila herdou do pugilista não só o mesmo nome como a gana para lutar. Não nos ringues protegidos por cordas. Mas na vida, sem resguardo, dando a cara para bater. Gay, gordo e preto, Junior Ahzura, de 31 anos, só usou luvas de boxe em brincadeiras em casa. Hoje, usa as redes sociais para militar contra o preconceito e promover a aceitação de corpos e sexualidade, além de combater o racismo.
A forma que encontrou de disseminar o conhecimento que tem sobre os assuntos, após duas faculdades e o trabalho de pesquisador, foi usar a internet como seu ringue. Autor e apresentador do podcast Gordosfera, no primeiro episódio ele narra como foram as suas próprias descobertas e de como sua família foi importante no processo de acolhimento.
"Eu já nasci grande. Sou filho de uma mulher branca relativamente alta. Meu pai, um homem negro de 1, 88m, com porte físico largo. Todo mundo esperava um bebezão. E eu fui muito bem acolhido nessa família. Já havia pessoas gordas. Meu avô, por parte de pai, meus tios e tias", conta ele, que sofreu o primeiro bullying já na infância:
"Na pré-escola tive o primeiro caso, eu estava no prézinho e começaram a me chamar de baleia. E eu fiquei muito chateado porque ninguém tinha me chamado assim antes. Foi a primeira vez. Naquele momento eu tive uma leve compreensão e pensei: 'caramba, sou gordo, sou uma baleia'. Minha mãe viu que eu estava triste e em casa eu contei. Ela só me falou: 'Você é gordo e isso não é um problema'. A partir dali, passei a não ligar para quem me chamava de gordo. É o que eu sou e não tenho que trazer isso para uma ofensa".
Eu estava no prezinho e começaram a me chamar de baleia. E eu fiquei muito chateado porque ninguem tinha me chamado assim antes. Foi a primeira vez. Naquele momento eu tive uma leve compreensão e pensei: 'caramba, sou gordo, sou uma baleia
— Junior Ahzura, filho do boxeador Maguila
A decisão, porém, não impediu que mais e mais cenas como a da pré-escola se repetissem. Passaram a piorar quando chegou a adolecência e ele assumiu a homossexualidade. "Sempre fui um gordinho viado, era nerd também, ainda sou. Mas fui uma criança viada. Eu era muito gay e desde pequeno. E me zoavam muito porque eu era gordo, e depois porque eu era uma bichinha e minha voz não tinha engrossado como a dos outros meninos", descreve: "Não foi fácil. Mas fiz a mesma coisa quando decidi que eu era gordo e pronto. Até me zoavam muito mais por ser gordo".
Não por acaso a cruzada contra a gordofobia é pauta de muitos de seus trabalhos artísticos, que se transformaram em gravuras, colagens, desenhos, vídeos e fotos. Muitos deles já expostos em São Paulo, onde mora.
Até chegar à Universidade, onde se formou em Comunicação, Junior não tinha muita noção do que era racismo. Afinal, apesar de nascer numa família que teve um passado muito humilde, com a profissão de Maguila e seus títulos, ele teve privilégios que a grande maioria de garotos pretos não têm.
"Tive uma infância meio pública e privada. Meu pai é o Maguila, um dos maiores pugilistas do país, eu tive privilegios sociais e econômicos, sou fruto de uma relação interracial e sempre estudei em escolas particulares", inicia: "Estudei numa universidade tradicional, dentro de uma aristocracia imensa em São Paulo e no meu grupo de amigos tinha muitos bolsistas do Prouni. Uma vez, um colega veio me questionar se eu era bolsista. Eu disse que não e quis saber o por quê da pergunta. Ele disse que, como meus amigos eram da periferia, e eram bolsistas que eu também poderia ser. Mas insisti na pergunta. Aí ele falou: 'É só olhar pra você, seu cabelo é duro'".
Junior Ahzura é filho do pugilista Maguila e de Irani Pinheiro — Foto: rep/ instagram
Para Junior esse foi o marco do racismo em sua direção. Dali por diante, o ativismo através da arte passou a ser mais forte. Além do podcast, ele atua no coletivo Adiposa Facção e dá aulas no Instituto Moreira Salles, em São Paulo.
unior Ahzura — Foto: rep/ instagram
Fonte: Extra On Line
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